03/01/2013

O circo da Solidão!



Bocas desdentadas anunciavam a chegada do circo a cidade.
A voz animada do locutor era um canto por todos os cantos do silencio donde viviam os poucos curiosos em conhecer “O Solitário”.
“Venham ver, pela primeira vez entre vocês aquele que nunca esteve entre outrem! Venham ver O Solitário!”

Na noite de estreia, todos os ingressos tinham um bolso para dormir.
A plateia ansiosa desejava contemplar o Solitário como só os olhos virgens podem desejar ver!
Ele, que só teve a própria sombra como companhia, estava agora na imaginação dos muitos pagantes sentados ao redor do improvisado palco pouco iluminado.
As cortinas se abrem e a figura do Solitário jaz sob uma luz fumegante que faz queimar os cabelos grisalhos pelo passar do tempo!
Ele se levanta, curva-se educadamente, beija as pontas dos dedos enquanto admira os muitos olhares que o observam e diz:

“- E o que é um solitário?
Eu! Eu sou um solitário!
Sou como um poço profundo indo cada vez mais pro fundo de mim mesmo.
Sou um poço escuro, uma cova fria onde muitos atiram pedras, mas donde poucos se arriscariam a resgatar alguma!
Eu, eu sou o solitário!
A alma abandonada pelo corpo egoísta e querente de companhia.
Eu sou o comigo quando o Eu não mais é comigo mesmo.
Sou a sombra do que poderia ser, se vós, dotados de semelhantes, não me vissem como nulo ou se simplesmente fossem capazes de realmente ver-me.
Eu sou o instante!
O instante que precede vossas lagrimas.
Sou o fim do teu sorriso, sou o suor que lhe escorre da fronte no pânico da duvida.
Eu sou vosso maior abandono, vosso maior medo.
Sou suas mais desesperadas tentativas para manter-se nos olhares dos muitos que também desejam serem vistos... quistos!
Eu sou a solidão no ser!
Eu sou O solitário!
E agradeço vossa companhia nesta noite!
No céu deste picadeiro, faço-me lua e aceito-lhes como minhas estrelas!
Brilhemos!”

Terminado o breve discurso, a plateia põem-se de pé e aplaude.
Na mente do Solitário nasce a certeza de que as pessoas gostam do que não compreendem!
A luz artificial se apaga e a já então amada solidão retorna ao lar!

Sozinho em sua solidão, o Solitário compreende como era infundada tua paixão pela companhia.
Ele que já tanto esteve só, não é mais capaz de junto estar!
O Solitário compreende que por tanta solidão já vivida, a vida com mais de um torna-se um abismo de incompreensões mutuas!
Dizem que é “melhor sozinho do que mal acompanhado”. O Solitário descobre que é melhor apenas Ser!

Um comentário:

  1. "...as pessoas gostam do que não compreendem!"
    Pura verdade...
    Ser e nada mais... Justo!

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